sábado, junho 07, 2003

Fazes-me falta de Inês Pedrosa

Fazes-me tanta falta«Fazes-me falta» é o novo livro da jornalista Inês Pedrosa o qual quero tomar a liberdade de comentar.
Logo que o vi entre vários tí­tulos de autores portugueses chamou-me a atenção pelo nome. Todos nós sentimos saudades e faltas, por isso é fácil identificarmo-nos com o nome deste livro. Li o resumo da contra capa e comprei-o porque me despertou o interesse, porque fala de faltas que também sinto: a saudade de alguém que morreu, a solidão, a desilusão, o desamor, o cansaço, a fé, a crença (tanto na religião, como na fé e crença nas coisas e na vida), a desesperança e a esperança. É um livro contado a duas vozes: A voz de quem morreu e a de quem viveu para testemunhar essa morte. Entrecruza a fantasia e a imaginação com a verosimilhança: A fantasia da escritora que imagina como será que se sente quem morre, e a verosimilhança da dor de quem fica, de quem vê a morte do lado de cá, de quem sofre, de quem passa a viver das memórias daquela pessoa. Das memórias boas e das más. Da culpa de ter memórias más. Da saudade dos tempos bons da dúvida. Mistura a crença com a descrença. Fala de revolta e de conformismo.
Descreve cheiros e mistura-os com sentimentos, saudades e memórias. Fala da desilusão de quem se iludiu, de quem viveu de quem quer morrer.
Denota-se o desespero de quem quer dizer o que nunca mais dirá, nem que seja em sonho. Um «adeus», um «obrigada», um «desculpa», um «gosto muito de ti», que ficaram por dizer e que se resumem no «fazes-me falta». «Fazes-me falta» nem que seja por um minuto mais onde te possa dizer «adeus», «obrigada», «desculpa», «gosto muito de ti», «não vás embora». É impotência sentida de quem quer mudar o mundo e não pode e de quem, afinal, só queria «mudar o cenário» - o seu cenário.
Fala de dar e receber carinho ou da dúvida de quem não sabe se consegue dar carinho. Do querer, do poder. Do querer poder e do pisar para o alcançar. De traição. Trair quem se ama para se alcançar um sucesso, uma ilusão de poder, que, no final, acaba amargo e amargurado. Da culpa. Da sensação ingénua que todos (ou quase todos) temos de que o tempo nos pertence infinitamente até que esse tempo nos prega a rasteira de nos tirar o que tínhamos como certo.
Fala de ser. De estar. De querer. De mudar e de desiludir. Explica como a pessoa muda a aparência mas nunca a essência e mostra como a aparência nos faz aos olhos dos outros, os fere, os orgulha, os desilude ou ilude.
Fala de tantas coisas: De amizade, daquela pura que ultrapassa muitas barreiras, incluindo a da morte mas não a do orgulho exacerbado; de amor não correspondido que deixa mágoa mesmo depois da morte; de sedução e indiferença; de provocações; de vontade de mudar o mundo; de ingenuidade e más interpretações. Fala, acima de tudo, de arrependimento e saudade. E da sensação de impotência pelo arrependimento de não ter feito algo já impossí­vel de fazer.

É um livro fantástico que recomendo a todos os que sentem as coisas com muita intensidade. Inês Pedrosa dedicou-o ao seu pai que tinha morrido há pouco tempo mas, logo no início da leitura, reparamos que o podemos dedicar a todos os que amamos ou, simplesmente, a nós próprios.