quarta-feira, janeiro 16, 2008

C.

Acabado de chegar dos Correios, onde à minha frente me deparei com uma única pessoa e cerca de 15 minutos de espera porque essa transportava consigo testículos e testículos de cartas, cartões, cartõezinhos, pacotes, pacotinhos e pacotões que, a avaliar pelo volume deixado nos CTT, deveriam estar acumulados na sua empresa desde Abril de 1983, mais coisa menos coisa.De qualquer modo, e depois desses 15 minutos, fui rapidamente atendido pelo funcionário que, ao despedir-se, me deseja uma "boa continuação".
Presumo eu que uma "boa continuação" seja a abreviatura de um cumprimento mais extenso que, provavelmente numa daquelas 1472 medidas do Simplex, tenha sido reduzido. Gostaria de acreditar que o mesmo funcionário há um ou dois anos se despedisse de todos os que ali se dirigissem com uma saudação do tipo: "espero que lhe tenha agradado o nosso serviço e quero que saiba que lhe desejo, do fundo do coração, uma boa continuação de dia, com tudo de bom para si e para os seus, que é o que importa realmente. Obrigado e volte sempre."
Claro que, a somar este paleio pelas pessoas que atende todos os dias, o homem perdiria cerca de 93,4% do seu tempo de trabalho, fazendo dele um dos 5 ou 6 funcionários públicos portugueses mais eficientes, com direito a comenda e tudo no próximo 10 de Junho.
No entanto, e mesmo que a resolução do governo incluída no pacote Simplex que instituiu a diminuição do palavreado utilizado para cumprimentar os utentes dos serviços públicos é uma boa ideia parece-me que, provavelmente por medo das represálias e manifestações das centrais sindicais, se ficou por uma certa timidez, podendo ter sido melhor aproveitada. É que, bem vistas as coisas, "boa continuação" ainda são duas palavras, uma carrada de letras e uns bons segundos gastos em algo tão irrisório como a cortesia e a boa educação.
Assim, venho por este meio propor ao Governo que no Simplex II proponha a redução de "boa continuação" para "continuação", "cont." ou, se existir coragem política para tal, um curto e eloquente "c.".
Parece-me o mais lógico, um tipo espera 15 minutos na fila por um cromo como o que referi anteriormente, faz o que tem a fazer, deseja bom dia ou boa tarde ao funcionário e ele responde "c.". A utilização ou não de um aceno de cabeça a acompanhar o "c." poderia ficar ao critério do próprio funcionário, desde que este não abusasse e o transformasse lentamente em acções tão despesistas como um aperto de mão ou um sorriso. Presumo que daqui a uns 10 anos ou assim também se pudesse legislar sobre isso, porque para já convém não abusar da boa vontade dos portugueses.

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